
Soberano Opina | A opinião que se impõe
Por Cláudio Ulhoa
Lula aposta em Boulos | Um aceno perigoso à radicalização política
Ao tentar transformar o ex-líder de invasões urbanas em senador por São Paulo, o governo revela o desespero por um sucessor e o flerte com o extremismo disfarçado de militância
Por Cláudio Ulhoa
O cenário político brasileiro vive uma ironia que nem o mais criativo roteirista ousaria imaginar: Luiz Inácio Lula da Silva, o homem que sempre se apresentou como símbolo da conciliação e da reconstrução democrática, prepara o terreno para lançar Guilherme Boulos, ex-líder do MTST e figura marcada por invasões e confrontos, como candidato ao Senado por São Paulo. É o casamento entre o pragmatismo político e a militância radical, e, no meio, está o eleitor, mais uma vez usado como instrumento de um projeto de poder.
Lula sabe que seu tempo político caminha para o fim. Envelhecido, enfrentando crises internas e com uma esquerda sem nomes sólidos, ele busca em Boulos uma espécie de herdeiro ideológico, alguém capaz de manter o discurso de “luta pelos pobres” vivo, ainda que por métodos questionáveis. O problema é que, em vez de renovar o debate, Lula flerta com o passado mais conflituoso da política brasileira. Boulos não é um nome de consenso, nem símbolo de gestão, mas um personagem conhecido por liderar ocupações, promover confrontos e transformar a desobediência civil em estratégia política.
Em 2017, Boulos foi detido em uma operação de reintegração de posse em São Paulo, durante um confronto envolvendo o MTST. Não era um caso isolado. Sua trajetória é marcada por episódios em que o limite entre o protesto e o crime se tornou difuso, tudo em nome de uma suposta justiça social. Esse histórico torna sua aproximação com Lula mais do que simbólica: é uma aposta em quem domina o caos como ferramenta política.
Para Lula, a escolha é tática. Ele precisa de um rosto jovem e carismático, alguém que dialogue com a periferia e mantenha viva a narrativa de luta popular. Mas, ao abraçar Boulos, o petismo abandona de vez a moderação e reforça a ideia de que a esquerda brasileira vive um ciclo de autorreferência, incapaz de se reinventar sem recorrer aos mesmos discursos radicais que dividiram o país. A aposta pode até render dividendos eleitorais, mas tende a aumentar o abismo entre o Planalto e o Brasil real, aquele que paga impostos, quer segurança e teme ver a lei ser relativizada.
O risco é claro: transformar o Senado, casa da ponderação, em um novo palanque de confronto ideológico. Boulos pode ter a oratória de um ativista, mas não tem o histórico de um conciliador. E Lula, ao insistir nessa candidatura, parece mais interessado em perpetuar seu legado político do que em fortalecer as instituições.
Num país exausto de extremos, a escolha de Lula por Guilherme Boulos soa como um grito de desespero político, um último ato de quem prefere apostar no barulho das ruas em vez da serenidade das ideias. Se o futuro da esquerda brasileira depende de quem aprendeu a invadir para ser ouvido, talvez o verdadeiro problema esteja em quem, no poder, escolhe escutar.