
Soberano Opina | A opinião que se impõe
Por Cláudio Ulhoa
PT aposta na ousadia | Por que transformar Oruam em deputado?
Em meio a um país cansado de escândalos, surge a articulação que une um cantor marcado por passagens pela polícia, o líder político mais controverso do Brasil e um partido disposto a normalizar o inacreditável.
Por Cláudio Ulhoa
A possível aproximação entre o rapper Oruam, artista envolvido em polêmicas, investigações e com histórico de prisão em anos anteriores, e o Partido dos Trabalhadores reacendeu um debate que o Brasil insiste em evitar: até onde vai o apetite político por poder, mesmo que isso signifique flertar com figuras cercadas de sombras? A visita ao diretório do PT no Rio, negada oficialmente pelo partido, mas amplamente noticiada, já bastou para provocar indignação. E com razão.
Oruam, filho de um criminoso amplamente conhecido pela polícia, agora surge como potencial aposta eleitoral. Não é exagero perguntar: qual interesse real existe em transformar o herdeiro de um dos nomes mais temidos do tráfico nacional em parlamentar? Num país onde tantas lideranças sérias lutam por espaço, essa movimentação soa como afronta, não como projeto político.
Adicione a tudo isso o apoio tácito de Lula, o ex-presidente “descondenado”, símbolo de uma era marcada por contradições morais e jurídicas, e o cenário fica ainda mais emblemático. A narrativa é clara: o PT tenta ampliar seu alcance com figuras populares entre jovens de periferia, mesmo quando essa popularidade vem carregada de conflitos com a lei, letras que glamourizam o submundo e vínculos familiares que fariam qualquer partido sério abrir os olhos.
É justamente aí que mora o desconforto profundo. A Câmara dos Deputados não pode ser laboratório de experiências sociais, nem vitrine para políticos de ocasião que surgem embalados pela estética do crime. Transformar isso em normalidade é um risco para qualquer democracia: abre-se a porta para a institucionalização daquilo que deveria ser combatido, não legitimado.
A pergunta que ecoa, não apenas entre opositores, mas entre cidadãos comuns, é simples e direta: por que o PT quer colocar um filho de traficante no poder? Seria capital eleitoral fácil? Seria estratégia para ocupar nichos culturais? Seria apenas desespero por juventude e engajamento? Ou estamos testemunhando algo mais grave: a erosão total do senso de responsabilidade política?
O partido nega a articulação. Natural. O desgaste seria enorme. Mas negar não apaga o fato de que essa possibilidade foi construída justamente porque alguém achou plausível. E isso, por si só, deveria nos alarmar. O risco não é apenas ele se lançar candidato, o risco é isso deixar de chocar.
O Brasil atravessa um momento em que a política precisa de reaproximação com valores básicos: idoneidade, clareza, compromisso com o bem público. Escolher figuras que carregam sombras familiares tão pesadas, histórico conturbado e símbolos de violência urbana não é revolução cultural, é irresponsabilidade maquiada de inclusão.
No fim, resta a sensação incômoda de que estamos diante de mais um capítulo de um país que relativiza tudo: ética, passado, alianças, princípios. Se essa candidatura se concretizar, não será apenas um movimento político — será um símbolo poderoso de que o abismo moral está mais perto do que gostaríamos de admitir.


