Argentina renova parte do Congresso em eleições que definem futuro de Milei

DOUGLAS GAVRAS
ROSÁRIO, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – O governo de Javier Milei esperava pintar o Congresso da Argentina de violeta, a cor do partido A Liberdade Avança. Este era o cenário há menos de dois meses, mas a expectativa de uma vitória arrasadora se desfez conforme as eleições legislativas deste domingo (26) se aproximavam.
Quase dois anos se passaram desde que os argentinos deram a Presidência a Milei, e os eleitores agora voltam às urnas para renovar um terço do Senado (24 de 72 vagas) e metade da Câmara (127 de 257 cadeiras)
O mileísmo, que ganhou as eleições de 2023 com ar de novidade, promessas ousadas de tirar o país da crise econômica e críticas severas à classe política tradicional, conseguiu reduzir a inflação, mas seu apoio tem diminuído desde que a economia estancou, o desemprego subiu e os salários e as aposentadorias ficaram achatados.
Uma sequência de crises também desgastou a imagem da Casa Rosada nos últimos meses: da promoção de um criptoativo sem lastro por Milei aos áudios do ex-diretor da agência para pessoas com deficiência, sugerindo que Karina Milei, a irmã e braço-direito do presidente, fosse beneficiada em um esquema de propinas na compra de medicamentos.
Erros táticos, como subestimar a força local de governadores, afetaram a posição dos mileístas em disputas eleitorais que eram consideradas seguras, como na estratégica Córdoba (que escolhe nove deputados), onde os libertários hoje concorrem com o ex-governador Juan Schiaretti. Em Santa Fé (também nove deputados), a briga é com o atual governador, Maximiliano Pullaro, que é parte do bloco opositor Províncias Unidas.
Uma sequência de derrotas no Legislativo também trouxe a percepção de que o governo perdeu a capacidade de impor sua agenda ao Congresso.
Analistas trabalham com três cenários para este domingo, considerando o total de votos em nível nacional: um resultado consagrador para Milei seria conquistar 40% ou mais dos votos; 35% seriam lidos como um empate, enquanto uma derrota preocupante seria algo próximo ou abaixo dos 30%.
O patamar de 40% tem peso simbólico: nas eleições presidenciais, como as de 2027, o candidato pode ser eleito em primeiro turno se receber 40% dos votos e ter uma distância de dez pontos percentuais do segundo colocado. Alcançando este limiar, o presidente sinaliza que está forte para concorrer à reeleição.
Atualmente, os governistas têm 74 cadeiras na Câmara (menos de um terço) e 13 no Senado (menos de um quinto). Projeções da consultoria Directorio Legislativo apontam que eles poderiam passar de um terço na Câmara e de um quarto no Senado, caso a Liberdade Avança tenha um desempenho mediano, de cerca de 35% dos votos nacionais.
Conquistar um terço da Câmara (86 assentos) daria ao governo uma quantidade mínima de cadeiras para evitar que os vetos do presidente fossem derrubados. Ainda assim, qualquer reforma tributária, trabalhista ou previdenciária que ele pretenda fazer continuaria exigindo uma aliança sólida para passar nas Casas.
A situação para Milei é mais confortável no distrito federal que compreende a cidade de Buenos Aires (que elege três senadores e 13 deputados), com a ministra Patricia Bullrich (Segurança) concorrendo ao Senado; em Mendoza (cinco deputados), há expectativa com a candidatura à Câmara do ministro Luis Petri (Defesa); em Salta (três senadores e três deputados), o peronismo local se dividiu.
O desapontamento de parte do eleitorado com o governo ficou explícito em setembro, nas eleições legislativas locais da província de Buenos Aires, a mais populosa do país. O partido do presidente foi derrotado pelo peronismo por mais de 13 pontos de diferença. Agora, Milei até pode conseguir um desempenho melhor na província de Buenos Aires (que renova 35 vagas de deputado), mas o principal colégio eleitoral do país é considerado perdido pelo governo.
Além de ser comandado pelo peronista Axel Kicillof, maior nome da oposição hoje, o território foi palco de um escândalo que derrubou semanas atrás o principal candidato do mileísmo, José Luis Espert, envolvido com um empresário investigado por narcotráfico.
O peronismo nacional tem seus principais quadros no Partido Justicialista, comandado pela ex-presidente Cristina Kirchner, e concorre nestas eleições pela coalizão Força Pátria. O grupo também tem chances de se impor nas províncias de Tucumán (elege quatro deputados), Formosa (dois deputados), La Pampa (três deputados), La Rioja (dois deputados) e Catamarca (três deputados).
A renovação de parte do Congresso argentino, que sempre é lida como um balanço da metade do mandato presidencial, ganhou um componente internacional neste ano. Milei chegou a interromper suas viagens de campanha pelas províncias para ir até a Casa Branca, onde recebeu apoio do presidente Donald Trump.
O republicano fez o Tesouro dos EUA intervir para evitar uma crise cambial na Argentina às vésperas das eleições, com a disparada do dólar, mas avançou o sinal ao condicionar sua ajuda ao resultado eleitoral, o que irritou parte da opinião pública e assustou o mercado.
O governo espera que Milei saia mais forte das urnas a partir de segunda-feira (27), apontando que a sua coalizão, que incorporou o PRO (do ex-presidente Mauricio Macri), é a única que compete com o mesmo nome em todas as províncias. O peronismo, por sua vez, concorre dividido em diversas vertentes locais do movimento.
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