Entenda o Tarifaço dos EUA sobre o Brasil

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Era quarta-feira (9), final da tarde, o mercado já tinha fechado, quando a notícia de que o Brasil sofreria com uma alta tarifa sobre seus produtos exportados aos Estados Unidos estourou. Em carta enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Donald Trump avisava que os itens brasileiros passariam a ser taxados em 50% a partir de 1º de agosto.
O anúncio surpreendeu não só o Brasil, mas o mundo, com bastante repercussão na mídia internacional, especialmente porque as justificativas para a elevação da tarifa se basearam em questões políticas. Embora inicialmente, Lula tenha adotado uma postura mais ofensiva, afirmando que usaria a Lei da Reciprocidade, no dia seguinte, destacou em entrevistas que o Brasil buscará o diálogo para resolver o impasse. No entanto, se as conversas não surtirem efeito, os produtos americanos também devem sofrer com taxas de 50%.
Enquanto se espera o desfecho dessa história, ficam as incertezas e uma série de dúvidas. A Forbes Brasil traz abaixo o que você precisa saber sobre esse conflito geopolítico – e financeiro.
As alegações de Trump
O presidente americano mostrou descontentamento em relação a episódios envolvendo o Superior Tribunal Federal (STF). Um deles é o processo em que o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL) responde na suprema corte por diversas acusações, dentre elas, a de tentativa de golpe de Estado. Para Trump, isso é uma “caça às bruxas”.
O outro episódio é relacionado às empresas americanas de tecnologia e o Marco Civil da Internet, que foi alterado pelo STF. A mudança aumenta a responsabilização das redes sociais sobre conteúdos publicados, já que passam a responder civilmente por eles, caso não removam postagens de crimes graves de forma pró-ativa, antes de decisão judicial.
Por fim, o presidente americano afirmou que a medida foi uma resposta às barreiras comerciais impostas pelo Brasil aos produtos americanos, o que estaria desequilibrando a balança comercial entre os países.
No entanto, dados da Comex mostram que nas negociações entre os dois países, a balança comercial pende para o lado americano. Para se ter ideia, em 2024, o déficit brasileiro foi de US$ 283,8 milhões (R$ 1,57 bilhão), ao importar US$ 40,65 bilhões (R$ 226,1 bilhões) contra US$ 40,36 bilhões (R$ 224,4 bilhões ) exportados para os Estados Unidos. A nova taxa é a maior imposta por Trump desde o fim do prazo de 90 dias para a negociação dos acordos bilaterais – 9 de julho –.
Balança comercial
Tanto em exportações quanto em importações, os EUA são o segundo maior parceiro econômico do Brasil. O país recebe 12% das vendas brasileiras para o exterior, enquanto corresponde a 15% do que é adquirido pelo Brasil no comércio internacional.
Em 2024, ferro e aço corresponderam a 8,8% das exportações para os Estados Unidos, seguidos por aeronaves e seus equipamentos (6,7%) e Ferro-gusa, spiegel, ferro-esponja, grânulos e pó de ferro ou aço e ferro-ligas (4,4%). Já as importações são centralizadas em motores e máquinas não elétricos, e suas peças (15%), óleos combustíveis de petróleo ou de minerais betuminosos (9,7%) e aeronaves (4,9%).
Já no primeiro semestre deste ano, de acordo com dados da Amcham – câmara americana de comércio fora dos EUA – o superávit americano nas negociações com o Brasil foi de US$ 1,7 bilhão (R$ 9,5 bilhões), um aumento de 500% em relação ao mesmo período do ano passado. O fluxo comercial entre os países avançou, foi de 7,7% nos seis primeiros meses, o maior da série histórica – totalizando US$ 41,7 bilhões (R$ 231,9 bilhões).
No entanto, a instituição afirma que as tarifas – ainda em 10% – já mostram seus efeitos. Segundo ela, alguns setores já mostram retração nas vendas para os EUA, como o de celulose, que teve queda de 14,9%, o de motores (7,6%), máquinas e equipamentos (23,6%), manufaturas de madeira (14%) e autopeças (5,6%).
O que pode vir por aí
Vale lembrar que, em abril deste ano, diversos países passaram a ser tarifados ou tiveram suas taxas de importação reajustadas pelos Estados Unidos. A ocasião foi chamada de “Dia da Libertação” pelo presidente americano e definia uma tarifa de 10% sobre itens vindos do Brasil.
Com uma possível disparada para 50%, o banco Santander entende que o impacto deve ser maior, podendo reduzir o superávit e afetar o Produto Interno Bruto (PIB), com uma queda entre 0,2 ponto percentual (p.p.) e 0,3 p.p. Diante disso, a instituição projeta um declínio de 25% nas exportações brasileiras, com os setores do aço e de aeronaves sendo os mais afetados, ao sofrerem uma queda de 50%.
Por outro lado, analistas acreditam que o fato das exportações brasileiras serem em sua maioria commodities, há uma grande possibilidade de redirecionar esses produtos para outros mercados. Por outro lado, as importações são mais diversificadas e isso pode ser um desafio.
Para a XP, neste aspecto, Embraer, Suzano e Tupy devem ser as empresas que mais sofrerão com o cenário. Respectivamente, o mercado americano corresponde a 23,8%, 16,6% e 13,9% da receita que essas empresas conseguem com as exportações.
Se passar a vigorar, a nova tarifa também deve impactar o mercado de câmbio e a inflação, pois a pressão sobre o dólar pode manter a alta dos preços. “Isso potencialmente reduzirá o investimento no país, ampliando o quadro de desaceleração pelo impacto da elevada Selic no momento”, observa o Inter.
O investimento direto estrangeiro (IDE) é outro ponto de atenção, já que os Estados Unidos lideram a participação societária nesses ativos, correspondendo a US$ 270,4 bilhões (R$ 1,5 trilhão) – 26,7% do total –, portanto, uma taxa mais alta poderia reduzir esse montante.